segunda-feira, 2 de julho de 2007

nunca será um conjunto de dias.

Eu olho pra fora e vejo o dentro. aqui só há remendos. há o teu coração e o meu pulmão. os teus rins e o meu cérebro. respiro a dor do tempo e nem percebo que horas são. será que os ponteiros não reparam que eu quero que eles parem? que a minha bateria acabe? até que batam em mim, dizendo : "volta a funcionar, porcaria!"... é que hoje eu me sinto tão oca quanto essa bola de sabão... estou prestes a estourar, juro. recolho das minhas unhas o gosto que tinha a tua poesia e me embriago. sou verme, sou pó, sou o teu sapato.
Vou olhando lentamente, esses velhos retratos que me penteiam as paredes e na ânsia de os perceber, vou cosendo à ponta do polegar esse, este vazio que me corrompe as artérias, como esses malditos ponteiros, que não me escutam os pedidos, essas vozes que se cruzam na infinidade da minha garganta (já a engoli). E a pele que me varre o chão, vai sorrindo para a imensidão dos teus cabelos que rastejam pela dureza da cadeira.
Enquanto levo os teus lábios, esses teus lábios de jasmim, a passearem pelas minhas mãos. E me perco nesse lado de dentro, que não é lado nenhum. Porque hoje, não há lado de dentro. Tudo me parece o mesmo, o silêncio jaz na tua garganta (também, não a engoliste!)
e ao me perder, te encontro. a luz que se faz aqui, reverbera o teu silêncio. fico presa, observando. será que o mundo todo vê? eu queria era que todos dormissem. não cortem meus sonhos, por favor. porque descobri ter uma língua própria, onde há um só verbo e uma só pessoa. não, não me cubram de regalias, quero só o desmantelo da tarde. de volta. estou aqui, de volta à realidade esfumaçada dos sonhos. bebendo a escuma do mar. salgando meu sangue, pois que não mais quero ter sede dele. matar a fome de vampiro em outra veia, que não a minha.
Mas eles não dormem. E saber dessa minha língua,onde só uma cor me preenche os tímpanos, é querer dizer-lhes, a esses que não vestem o sono, como eu me tatuei na dor, que todo o conjunto de dias, é para mim, nestes meus olhos cegos, o teu rosto descomposto, esvoaçando por entre as vitrinas da minha casa. E eu nem queria ir para casa. Mas já há vida lá fora - o teu rosto (des)composto nunca foi um conjunto de dias.E hoje, não nasce em mim, essa saudade de viver - rebentar-me-ia com o peito.
Sim, há vida lá fora. mas e quando o dentro comer o fora, o que faremos nós? talvez andemos descalças por aí, desejando pisar em cacos, sentir o vermelho manchar a pele de novo. porque a morte vem e nem sente a vida gritando. não sente que esse mundo é um desespero e eu, louca e perdida, sinto o teu cheiro em cada canto, o teu gosto nas minhas feridas expostas. não me diga que o mundo acaba hoje, senão começarei a dançar até que me tenham de amputar os pés, já que o coração, já me foi tirado. olho pra cima, lá há o teu rosto, preto e branco. brancura que como com dedos sujos de poesia. não vês que em mim há mais dúvidas que certezas? e a minha dívida é com a vida. nefelibata desenfreada, perdida.
A morte virá e encharcar-nos-á esses pés, que se contentarão com os cacos - serão pedaços de nada, saltando por entre as ruas, em breves palpitações, para com o tudo. E esse odor que se infiltrará pela nossa casa (porque há vida lá fora) sujar-nos-á os retratos que nos penteiam as paredes e a brancura que nos cobrirá os dedos, afundar-se-á no polegar, onde outrora havia sido cosido esse vazio,amor. E com o pescoço deruçado sobre as mãos, por onde os teus lábios de jasmim ainda passeiam, aperceber-me-ei de que esse teu olhar não existirá apenas, quando eu erguer a cabeça, apoiando-a nos ombros. O teu perfume ecoará nos meus ouvidos, como a pronúncia habitual da minha dor (eu tatuei-me nela) e eu serei só mais uma canção antiga, uma melodia deficientemente composta - como uma cicatriz nesse teu pequeno canto esquerdo do rosto - o teu nunca será um conjunto de dias.





texto composto por Patrícia Lino e eu.
porque ela me inspira.sempre.

5 comentários:

Patrícia Lino disse...

para sempre.

Salve Jorge disse...

Escrevi lá dos lados dela.. mas não fundarei querela.. volto a esta tela, com hábil recortar e colar..


Sois a soma
QUe assoma
Mesmo distante
Distoam
DAs infantes
Sois inebriantes
Para meu peito arfante
E meus dedos diletantes
Vendo-as amantes
Com vossas cicatrizes
Essas marcas
De quem arca
Com a parca realidade
De não ser tudo
Onírico
É o ônus do risco
De ter tudo
E no fim o que sobra
Parecer nada
Merecer a privada
E vós a ausência do público
Desses púdicos
Reclamões
Inflem os pulmões
E calegem os corações
Pois haverão tantos e tamanhos arpões
Que morreram impaladas
De quando em vez
E quando não, de vez em quando
Não é como mando
Mas como me mandam
Nesse discurso inexato
De quem apenas sabe
Ser gazela no prato
Ofertada aos dentes mais ávidos
E que minha carne salgada
Pode bem ser iguaria rara
Ou dejetos
Isso separado apenas por uma vã perspectiva
Que não nos apreende
Nem nos define
Apenas convida
A rir ou chorar
Chorarei rindo
Se você gostar
E guardarei o riso choroso
Até vê-las cantar..

Ao par..
Ao mar..
Ah, mar..
Ah, par..

poeta quebrado disse...

adoro
decoro
devoro

dói
e é lindo, porra.

Alexandra Mendes disse...

Parabéns =)


o texto está espantoso. fogo =O

poeta quebrado disse...

te encontro
em qualquer rua
em qualquer chuva
ignoro o mapa
e canto baixinho:

my love, i send this smile over to you.